quinta-feira, 4 de abril de 2013
A POLÍTICA - Os Jenipapeiríadas - Oitavo Canto
A P O L Í T I C A
I
Nascida como nasciam
as vilas pelo Brasil,
atrelavam-se ao poder
religioso e civil,
vezes aquele mandando,
tornando o outro servil,
porém usavam se unirem
pra juntos o compartirem.
II
Chamou-se Jenipapeiro
a vila recém-criada,
e por pertencer a Picos
ficou a ele atrelada,
tendo por representante
figura bem destacada
na cena regional
e até na estadual.
III
Mas por que Jenipapeiro?
Esclarece a tradição
que o topônimo se explica
pela grande profusão
dessa árvore na terra;
porém há contradição.
Discutível, em que pese,
alguém levanta outra tese.
IV
Nega o autor dessa tese
a existência em quantidade
de jenipapo entre nós
que desse conformidade
à razão que a tradição
exprime como verdade,
embora correlação
guarde a denominação.
V
Jenipapeiro seria
patriótica homenagem
aos Heróis do Jenipapo,
luta de audácia e coragem
de bravos piauienses
contra a lusa vassalagem,
enfrentando Fidié,
com sangue, suor e fé.
VI
O autor do postulado,
Mariano da Silva Neto,
informa que essa batalha,
mesmo de modo indireto,
afetou a todos nós
no amor e no afeto.
Daí a justa comenda
pela sangrenta contenda.
VII
Passou-se o tempo... O arraial,
como uma entidade viva,
aos poucos foi-se livrando
da vida vegetativa,
inflamando-se a si mesmo
como o fogo que se ativa,
ganhando em seu ideário
doce sonho libertário!
VIII
Em virtude da dinâmica
da expansão familial,
embora ainda endogâmica,
foi coisa bem natural
surgirem as dissidências
da família original,
obra da democracia,
que engendra a cidadania.
IX
Fruto dessa dissidência,
no cenário despontou
Francisco Rodrigues Sales,
homem probo de valor,
edil pela UDN,
o partido opositor
ao PSD mandante,
hegemônico, arrogante.
X
No outro pleito Elizeu
se elegeu vereador,
tornando-se lá em Picos
também nosso defensor.
Projetos de melhoria
defendeu e aprovou,
conseguindo algo de novo
para o seu sofrido povo.
XI
Com isso se fez preciso
Seu Licínio dividir
com seu irmão Elizeu
o encargo de dirigir
a política local
pra poder melhor servir
ao povo bom e ordeiro,
humilde, mas altaneiro.
XII
Quando não se resolviam
as pendengas por aqui,
remetiam ao Coronel,
em Picos, pra dirimir
e encontrar a solução
que viesse de servir
para as partes litigantes,
sem maiores agravantes.
XIII
Um papel, um documento,
qualquer caso de saúde,
o avio da receita...
A isso tudo, amiúde,
Seu Chico entrava em ação,
com total solicitude,
sem cobrar contrapartida
da gente desassistida.
XIV
Mas não ficava só nisso
seu zelo e dedicação:
- tinha o matuto o conselho,
o carinho, a atenção,
a hospedagem gratuita,
boa cama e refeição,
a quinta pros animais...
Tudo isso e muito mais
XV
Para os íntimos chamado
“Seu Chico”. Em Jenipapeiro,
ele era sempre lembrado
como o defensor primeiro,
sempre recebendo em Picos
o matuto mangalheiro...
Eis o retrato em moldura
do nosso “Chico Fartura”.
XVI
Por tais e tantos serviços
prestados pelo querido
Coronel Francisco Santos,
Elizeu foi escolhido,
em nível local, o líder
de seu povo agradecido,
tornando-se legatário
desse prêmio feudatário!
XVII
Decidido e arrojado,
Elizeu, com competência,
costurando simpatias,
angariou a anuência
do povo para o projeto
da futura independência;
faltava vender a idéia
aos deputados da Assembléia.
XVIII
Correndo daqui pra Picos
ou pra capital do Estado,
confrontando lideranças,
convencendo deputados,
remando contra interesses
servis ou contrariados
- lutando quase sozinho,
foi preparando o caminho.
XIX
No dia da votação
na Assembléia decisória,
o prócer da região,
de forma conspiratória,
retirou-se do plenário...
Mas era tarde: a vitória
apontou a aprovação
de nossa emancipação!
XX
O outro lado chiou,
reclamou com espalhafato,
bradando ilegalidades
havidas naquele ato,
prometendo aos partidários
logo reverter o fato...
Falação de derrotado
contra fato consumado.
XXI
Toda essa motivação
de protesto e rebeldia,
é preciso que se diga,
toda ela residia
no fato de o perdedor
encontrar-se em minoria,
portanto alijado e assim
fora do político butim.
XXII
A difícil independência
arduamente conseguida,
trouxe um sentimento estranho
à pessoa embevecida,
o prazer de descobrir
novo sentido pra vida
- era o Homem da Caverna
ao sol da era moderna.
XXIII
Espera de longo prazo
vira, enfim, realidade,
sentimento messiânico
por mais ampla liberdade:
- mãe-Picos agora posta
no mesmo pé de igualdade,
pois rompera-se, afinal,
o cordão umbilical.
XXIV
Instalou-se o município
com toda festividade;
por todo lugar sorriam
o povo e as autoridades,
todos orgulhosos com
o novo status de cidade,
embora muito faltasse
para que roda engrenasse.
XXV
Com isso aquela faceta
de ingenuidade e pureza
se foi aos poucos sumindo
nos palpos da esperteza,
porque o homem se vende
bastando que em sua mesa
se ponha um prato de arroz
ou um belo baião-de-dois.
XXVI
Cargos, verbas e empregos
viram moeda de troca,
a corrupção a comer
o caráter como a broca
na madeira fraca ou podre,
processo que desemboca
na máxima que hoje concebe
o “é dando que se recebe”.
XXVII
Assim a fidelidade
ao líder e ao partido
virou interesse vil
de comprador e vendido;
caráter se fez valor
completamente esquecido...
No bloco dessa fanfarra,
muita gente entrou na farra.
XXVIII
A partir desse momento,
com a alma merencória,
em atenção aos dez justos
salvados da vil escória,
faço correr as cortinas
sobre os anais da história,
pois me nego de narrar
tragédia nada exemplar.
XXIX
Apesar da subversão
dos essenciais valores,
a nossa emancipação
merece canto e louvores,
pois sem ela o IDH
dos nossos indicadores
seriam de mais miséria,
aviltante, deletéria.
XXX
A passo de tartaruga,
iam os órgãos se instalando,
os municipais primeiro,
os do estado secundando,
os federais, como sempre,
a conta-gotas chegando...
O ensino foi o setor
que mais depressa medrou.
XXXI
A nossa primeira escola,
chamada Casa Rural,
só chegou em 35,
quando o modesto arraial
transformou-se em povoado,
muito elevando o moral
de sua gente simplória
não obstante finória.
XXXII
No ensino das primas letras,
destaco em primeira linha
mestres-escolas amados
como dona Mariinha,
Luiz Chaves e Da Luz,
Carmosa, minha madrinha
e Mundico de Boronga,
de erudição fina e longa.
XXXIII
O maior de todos eles
retirou da ignorância
desde marmanjos barbudos
a nenéns da pré-infância,
a todos lecionando
sem orgulho e sem jactância.
Nos haveres, sempre pobre:
- MIGUEL de coração nobre!
XXXIV
Certo dia, o secretário,
gestor da educação,
em visita ao município,
recebeu de um cidadão,
lavrador desenxabido,
porém muito pé-no-chão,
um insólito pedido
que o deixou surpreendido.
XXXV
“Um ginásio pra esta terra
peço pro senhor trazer;
como aqui só há o primário,
não preciso lhe dizer
que o jovem, ao concluí-lo,
fica navios a ver,
pois ninguém pode botar
filhos fora pra estudar”.
XXXVI
O tempo correu... as coisas
também nos trilhos correndo;
conforme o eclesiastes,
tudo foi acontecendo
nem antes e nem depois,
mas na hora... E assim sendo,
o “Cristo REI” foi criado
após seis anos passados.
XXXVII
Toda idéia é qual semente
no solo do agricultor.
Se a criação é de Deus,
Deus, então, é o criador.
Se o pedido de um ginásio
partiu de um agricultor,
a Carleusa a gratidão
pela sua instalação.
Para inserir um comentário, vá abaixo na palavra "comentários", e deixe sua opinião.